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Bibliomaníaca e melómana. O resto terão de descobrir por vocês!

Sunday, September 14, 2014

Flanzine 5 – Cama


















A Cama é aberta por João Pedro Azul no editorial que é construído como uma metáfora do país. Trata-se de uma cama feita pelos eleitores portugueses que mediante a cor dos lençóis políticos que escolheram nela terão de se deitar.

Nesta edição de Flanzine os textos são de tal forma inspirados que se torna particularmente difícil salientar os que mais se destacam, mas tentaremos mesmo assim fazer uma apreciação.

As vicissitudes de uma cama contadas pelo narrador que nela espera a morte é o texto que enceta este número da revista e intitula-se “Como a Morte e...” da Autoria de Afonso Cruz. A fasquia é agora altíssima. Paola d'Agostino continua a saga peregrina com “Fátima Fiction” com uma narrativa provocatória em tom de ácida ironia. Ana Deus oferece-nos o erotismo escaldante de um poema em prosa a odisseia de uma vida de cama em cama dos amantes sem tecto. Continuamos com o texto narrativo para dar lugar a duas camas inquietantes, ambas elas cenários de um sono cheio de horror e medos, insónias extenuantes daqueles que as ocupam: a primeira, da autoria de Ana Tecedeiro incarna os terrores infantis da ausência e o pânico daquilo que se oculta na escuridão ou simplesmente debaixo do colchão; a segunda, de Inês Castro e Silva, faria as delícias do Pai da Psicanálise, recria um cenário perfeitamente claustrofóbico, numa casa onde cada cómodo parece emparedar os seus possíveis ocupantes. Segue-se um hino à cama como se fosse um altar onde se sacralizam as relações, assinada por ...Sermente. Raul Pereira dá-nos o fio caótico do pensamento das reflexões de um jornalista, na cama, a trabalhar a desoras. O poster desta edição surge-nos em tons vulcânicos, lava incandescente e basalto, que se repercutem nas formas da ânfora do corpo feminino, é de Ricardo Abreu com texto de João Pedro Azul. Paulo Moreira dá vida a um narrador que usa uma cama para descodificar o passado “Na Casa da Cama”. Mais uma deliciosa heresia desta vez por Manuel Jorge Marmelo, um provocador texto erótico que é uma “Terapia” cujo narrador debita, em tom confessional um fetichismo erótico por uma beata cujo sorriso tece promessas muito mais depravadas do que as habilidades das mais experientes amantes.

Sim, na verdade os textos desta cama em forma de pudim flan tornam-se difíceis de hierarquizar embora arrisque dizer que o quarteto formado por Afonso Cruz, Manuel Jorge Marmelo, Ana Tecedeiro e Inês Castro Silva sigam no pelotão da frente.

Na Poesia, saliento a vida de cama em cama cantada por Ana Deus. Seguem-se o conjunto de apócrifos de Luís Quintais, o lirismo castelhano de Pablo Javier, o minimalismo de Maria Quintans e o Fabuloso diálogo de “Miss K” da autoria de Joana Koehler e Tiago Gomes.

Nas ilustrações para além do já mencionado poster de Ricardo Abreu, são especialmente marcantes as mãos que agarram a cama de Ana Tecedeiro, a estranha casa de Filipe Silva, a cama Silvestre de David de las Heras, a sensual e provocante ilustração do auto-erotismo literário da criação de Alex Gozblau, os escaravelho de aspecto kafkiano de Joana Ray, o homem deitado de Artur Escarlate os fumos do fumador de Rui Rasquinho.

Quanto à fotografia destaca-se a imagem da mulher deitada num cândidamente velado leito de morte captado por Joana Linda e a sesta do casal por Tânia Cadima, a penumbra iluminada de um corpo adormecido da autoria de Rui Pinheiro.


A Cama está feita e aberta. Agora é deitar e desfrutar.


11.09.2011


Cláudia de Sousa Dias

Saturday, September 13, 2014

Flanzine 4 - Carrossel

















Às voltas no Carrossel andaram Autores como Manuel António Pimenta, Rute Castro, Joana Emídio Marques, Flávia Larocca, Ana Saramago, José Carlos Marques, Filipa Leal, Joana Gusmão, Susana Moreira Marques, Gonçalo Mira, Cláudia Lucas Chéu, Vítor Rua, João André, Vítor Sousa, Anthony Ghosto, Renato Filipe Cardoso, Vicente Alves do Ó, Rosalina Marshall e Helena Rocio Janeiro.

Os ilustradores, todos ele de inegável talento, dão pelo nome de Cátia Vidinhas, Ricardo Abreu, António Jorge Gonçalves, Cláudia Faro Santos, Joana Areal, A. Mimura, Daiena Dâmaso, Lina&Nando, Bruno Martins e Luís Manuel Gaspar.

As fotografias relacionadas com o conteúdo dos textos completam o catálogo deste Carrossel.

O editorial, da responsabilidade de João Pedro Azul, abre a revista com a caracterização do ambiente de Férias (e Feiras) que caracterizam o Verão português com as suas festas e romarias e o regresso pontual dos emigrantes para aquilo que hoje a comunicação social chama de silly season. Entreabrindo um pouco a cortina para o choque cultural resultante do confronto de pontos de vista entre\ quem olha o país vindo de fora e vê uma película de Fellini, e quem nunca saiu do país e olha quem regressa como se de uma horda de hunos se tratasse tal a estranheza dos hábitos e formas de expressão, gostos e preferências.

O mesmo editorial dá a entender ser este Carrossel uma espécie de desfile carnavalesco de provocações, que é encetado com o texto de Manuel António Pimenta, com um narrador a dirigir-se aos leitores numa espécie de confissão das primeiras manifestações do erotismo na sua vida, ainda nos primeiros anos da adolescência. Continuando dentro do género “prosa” passamos para um texto de grande beleza plástica de Joana Gusmão, um diálogo inter-textual com o romance Luz em Agosto de William Faulkner, com um texto de título homónimo, descrevendo a “luz” do Agosto português, encharcada de nostalgia e doçura de um tempo que ficou para trás, escondendo um tédio omnipresente e sufocante como a canícula. Susana Moreira Marques pinta-nos um quadro onde se fundem os elementos “naïf” e macabro sob o título de “Pai e Filha”. O belo e o grotesco, um inferno que parece espreitar por detrás de um lugar que procura parecer-se com o paraíso. Vítor Rua prossegue com a sua mala de sons, desenvolvendo o seu tratado de fonologia. Mas o travo verdadeiramente niilista é dado por Vítor Sousa cuja voz narrativa enceta um convite - “Quereis ir comigo ao Antigo Testamento” - para recriar uma realidade crua de um meio pequeno onde o cinismo e o despreendimento total afogamento da esperança em quem já não parece ter um pingo de inocência. Renato Filipe Cardoso mostra de que forma a brutalidade desfaz os sonhos e o romantismo da juventude com a mesma implacabilidade e ausência de compaixão com que uma hiena esventra uma gazela prenhe ao advertir: “Não andaime de Carrossel”. Nem no Carrossel nem nos andaimes, portanto. Em contraponto a esta visão pessimista em geral dos autores de prosa temos a doçura do texto de Vicente Alves do Ó, o deslumbramento diante da inocência absoluta demonstrada pela criança recém-nascida.

No plano da poesia, os carrosséis de palavras atingem o vórtice a provocar vertigens com Rute Castro que cita uma frase de Galileu após se ter retratado perante o Santo Ofício – E pur si muove – e Joana Emídio Marques com uma belíssima homenagens à Mãe e Flávia Larocca a girar e a encantar os ouvidos sobretudo dos mais jovens ao ouvir o seu “Giro e Gira”, delicioso nos seus jogos semânticos e fonéticos. Ana Saramago opta por uma quadra jocosa, uma sátira às quadras de Santo António. O texto de Amora Silvestre traz-nos um perfume baudelairiano a spleen para activar a “Memória”. A ousadia de Filipa Leal surge acompanhada de uma belíssima ilustração de Ricardo Abreu, num poema que dá o nome à Revista, “carrossel” recriando e transfigurando a figura mais clássica do Fado, Amália Rodrigues. O poema que ilustra o poster desta revista é cheio de cor e movimento e é da autoria de Gonçalo Mira, que descreve uma louca cavalgada de sonhos num carrossel de sensações, perfeitamente alinhado com os desenhos e maravilhosa paleta de cores de Cláudia Faro Santos. Mas é o “Círculo da Fome”, um círculo em movimento como um carrossel, da autoria de Cláudia Lucas Chéu que é a pérola dos mares do sul desta publicação acompanhado pela deslumbrante ilustração do arqui-continente Pangea, rodeado pelo grande oceano, por Joana Areal. A crítica e também o nonsense caracterizam os poemas minimalistas de A. Mimura e Anthony Ghosto.


Cláudia de Sousa Dias