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Wednesday, April 13, 2005

"Letra Só" de Caetano Veloso (Quasi)


“Letra Só” é uma colectânea de poemas de Caetano Veloso com selecção, organização e prefácio de Eucanaã Ferraz, que reúne todas as letras das canções do poeta e compositor publicadas até ao início do presente século.

A letras de Caetano Veloso surgem-nos em formato de livro, despidas da sua moldura habitual e à qual estamos habituados a associá-las: a música que as acompanha.

Mesmo assim, na sua nudez integral, os poemas de Caetano, quando lidos em voz alta, ouve-se perfeitamente que são dotados de um ritmo cantabile pela profusão de rimas, por vezes no princípio, meio e fim de cada verso, pelas constantes repetições e por um sem fim de trocadilhos fonéticos que aumentam, significativamente, as já de si, diversas possibilidades de interpretação.

Tudo isto em poemas aparentemente simples.

Neles, Caetano exprime, também, a sua vastíssima cultura, os seus valores, e principalmente a consciência acerca da realidade social do seu país. A temática da sua poesia é muitíssimo variada e distribui-se por dezassete segmentos ou capítulos.

O primeiro consiste num elogio à sua cidade Natal – Santo Amaro – e os poemas que o compõem são um compromisso situado algures entre a saudade e o desejo de libertação das amarras que o mantém amarrado às suas raízes (ver “Acrilírico).

Depois, a “Bahia, estação primeira do Brasil”, a primeira paragem de Caetano Veloso após deixar a sua terra natal.

O terceiro capítulo aborda o “Tropicalismo”, corrente da que inspirou a música dos anos 60 e 70 e que, segundo Eucanaã Ferraz, se baseia “na inserção do efémero, do volátil, do circunstancial, uma trilha que levaria a uma certa desintelectualização muito semelhante aos movimentos daquilo a que se chamou de “contracultura”.
Ferraz classifica as letras de Caetano como “dotadas de uma medida valiosa tanto para a poesia escrita como para a canção, versos de pulsação acelerada (…), brasilidade, dança, corpo…”

Neste segmento, dedicado ao tropicalismo, encontramos alguns poemas de intervenção política manifestando forte oposição à ditadura militar como”Enquanto o Lobo não vem” e “é proibido proibir” fazendo lembrar o Maio de 68.

A seguir vem “Alguém Cantando” onde se faz a apologia do canto, da música, das vozes dos intérpretes…

Destituído de qualquer pretensão afirma: “Sou um homem comum”, o quinto segmento deste poemário que se debruça sobre o EU e onde achamos o seu lado rebelde, o seu lado romântico, recheado de idealismos, desejos e…um canto intocado da mente.


Segue-se a “Gente” mais próxima: os afectos e as pessoas mais significativas para o poeta (“Gente viva brilhando, estrelas na noite” - extracto do poema “gente” do capítulo com o mesmo nome).

Alguns dos poemas mais sublimes de Caetano estão em “Bruta flor do querer”, poemas de amor, desamor e ciúme.

“Projecto Brasil”, o oitavo capítulo, pretende mostrar a realidade social, o desfasamento económico em relação à América anglo-saxónica, com especial destaque para a extrema pobreza que grassa nas principais cidades brasileiras abrangendo a esmagadora maioria dos seus habitantes, para a criminalidade, para a ineficácia da justiça…

No nono segmento ou capítulo, intitulado “Essa cidade me atravessa” temos a cidade do Rio de Janeiro do ponto de vista do nativo e do ponto de vista do outsider ; a comparação com outras cidades, o que mostra o quanto o Autor é um cidadão do mundo (ver “Vaca profana” e “London, London” uma lindíssima composição escrita na língua de Byron, povoada de rima perfeitas e imperfeitas, sobre um ponto do planeta onde o autor é, desta vez, ele próprio, um outsider). Extremamente crítico em relação às certezas dos americanos que vivem num mundo cheio de compartimentos, como um apartheid não oficializado, que adoram, antes de tudo, o deus do dinheiro, (ver “Americanos” e “Manhatã”). E também o canto de saudade do Rio, com os seus contrastes, a espontaneidade e joie de vivre das suas gentes, do clima a partir do”saco de São Francisco” no poema intitulado “Meu Rio”.

O décimo segmento de “Letra Só”, chamado “Pedra, Vida, Flor” fala-nos das coisas da natureza: o coro das rãs, numa noite pacífica, a terra, a liberdade na asa de um pássaro, cuja deslocação de ar provocada pelo movimento ateia as brasas debaixo das cinzas; o verde do deus dos fetos nos olhos verdes da mulher amada; liberdade do amor sem tabus simbolizada no corpo e asas de uma borboleta e em “A grande borboleta” – uma das jóias da poesia de Caetano -, a doçura dos frutos tropicais (ou das mulheres tropicais), a Lua como cúmplice do amor em “Lua de S. Jorge”, “Queda d’Água” e “Shy Moon”; os poemas de água – ligação directa a Iemanjá, deusa das águas, da beleza e do amor (a Vénus dos orixás) e o poema de intervenção contra a poluição aquática “Purificar o Subaé”.

A existência vem no segmento seguinte, o décimo primeiro - “Existir, a que se destina?” - : a Terra por onde passa a alma do navegador, a tentação, a fome carnal de afecto, em “Pecado Original”, “Cajuína”, “Pele” e “O Homem Velho” e, o lado negro do amor, em “Ciúme”,

Os deuses e a santidade são abordados no capítulo “Os Deuses sem Deus”: o panteísmo em “Génesis”, o tempo como ser eterno ou não-ser em “Tempo”, uma deusa Diamantina em “Gema” e a apologia a um “Menino Deus” muito terreno, os milagres dos orixás em “Milagres do Povo” fazendo lembrar um texto de Jorge Amado retirado de “A tenda dos Milagres” ou “O Sumiço da Santa”, a mediatização dos ritos e do sobrenatural em “Santa Clara, padroeira da Televisão”.

A seguir vem a experimentação, os jogos de palavras, a pesquisa da linguagem num conjunto de magníficos poemas intitulado “Outras palavras”. Alguns extremamente simples, outros mais complexos cujos trocadilhos abrangem dissertações e uma infinidade de associações de carácter filosófico (“Outras Palavras”), históricas (“Ele me deu um beijo na boca” e Alexandre”) ou sociológicas (“Eu sou Neguinha?).

O cinema serve de inspiração ao capítulo seguinte como nos poemas “Cinema Olympia”, “Giulietta Masina” (ícone do cinema italiano) e “Cinema Novo” com múltiplas referências cinematográficas brasileiras ou não. Em suma, o cinema como motor de emoção.

Os livros e a literatura ocupam o capítulo que se segue, intitulado “Mundos no Mundo”, precisamente por permitirem ao leitor viajar virtualmente e que, além disso, possibilitam um aumento exponencial do conhecimento semelhante à explosão do Big Bang (ver poema intitulado “Livros”).

O Carnaval, a festa emblemática do Brasil da nação brasileira, é de-batido em “O Bater do Tambor”, décimo quinto capítulo da obra.

O último segmento é composto por uma temática variada, é como que uma síntese dos capítulos anteriores onde reencontramos: o amor, a saudade, o samba, a religião, e uma das pessoas que mais admira – “Tom” .

Um tom a mais ou a menos na música uma variação musical. Um tom.

Um Tom. Na música.

Jobim, só pode.

Caetano Veloso.

Sempre no tom.

Irrepreensível.

Na poesia e na Música.

Não acham?



Cláudia de Sousa Dias

3 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Sim, claro, sempre!

Bom esse teu texto.

Parabéns.

6:51 PM  
Anonymous Anonymous said...

Olá!
Sou eu, novamente.
Isto, por aqui, está mau.
Mas o teu texto está bom.

Gostei da tua resposta, Claudia.
Acusar as pessoas e sem dar a cara é do pior que há. Não se faz e, por isso, não se deve dar crédito.

Artur

6:28 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

Olá Artur!

Bom ver-te de novo por cá!

Gosto de falar sobre bons livros e este é um deles!

Quanto ao resto, nem merece ser mencionado.

Beijinhos!

6:02 PM  

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